505: Track 6 - Side A

- Marie, me ajuda. Preciso comprar roupas novas. – Eu estava desesperada no telefone. De repente eu havia notado que não tinha roupa nenhuma para ir ao show. Por algum motivo isso me deixou levemente desesperada. Comecei a pensar que aquilo seria um desastre.  Faltava apenas um dia.
- Calma, calma eu estou aqui. Que horas você sai do trabalho hoje? – Ela era quase uma fada madrinha para mim. Eu não sei o que eu faria sem ela. Seu visual também combinava com esse ar, os cabelos loiros curtinhos e repicados iam muito bem com ela.
- O horário de sempre. – Quase que pude vê-la assentindo positivamente do outro lado, eu já conhecia sua forma de agir.
- Ok! Eu te busco aí. – Sorrio, percebo que não estou sozinha e esse é o melhor sentimento do universo. Pode faltar amor, mas não pode faltar amizade, isso é uma coisa que eu aprendi na minha vida. Apesar da minha amiga não ser o melhor exemplo de pessoa ela nunca havia me abandonado, nossas diferenças diminuíam quando ela se juntava a mim para fazer sua parte.
Marie era moderníssima, trabalhava num escritório como Designer, desenhava  e as vezes fazia desenhos de tatuagens para um estúdio próximo a nossa casa. Ela me prometeu que minha primeira tatuagem seria feita de um desenho dela. A minha melhor amiga sempre sabia dos últimos lançamentos da música, estava nas melhores festas e haviam boatos de que ela havia ficado com o Jude Law uma vez, ela nunca desmentiu, mas também nunca confirmou.
Eu era esse projeto de arquiteta, completamente antiquada. Não fazia nada além  do meu curso na faculdade e reclamar da vida. Não gostava de festas, não gostava de shows e tinha a mesma playlist há 10 anos. Nunca fiquei com mais de 10 pessoas e não sabia muito bem se me orgulhava disso ou não.
Minha eterna coleção de jeans, camiseta e vestido de repente não cabia mais para o show do Arctic Monkeys, eu precisava vestir algo decente, por algum motivo eu queria muito impressionar o Alex. Enquanto eu deveria estar analisando o pedido de reforma de um prédio antigo no Harlem eu estava analisando os videoclipes da banda.
Alex parecia ser um cara badass, com seu topete Elvis Presley, camiseta branca ou preta, por de baixo de um casaco de couro, jeans e botas de motociclista. Me senti completamente sem estilo para sair no show dele. Eu pareceria minimamente errada, me senti completamente estranha.
Ele fazia poses, carões, fumava um cigarro com mais estilo que qualquer coisa.
E pensar que alguns dias antes ele estava era bêbada na minha porta, chorando e completamente sem nenhuma condição de chegar em casa era para ser cômico. Por algum motivo me sentia bem por saber que ele não era esse machão todo. Sei que isso soa um pouco sádico, mas no meu lugar qualquer um sentiria o mesmo, isso é um fato.
Engraçado é que a louca descompensada também era eu e agora eu queria pagar de boazona, exatamente como ele fazia nos clipes. Pensar que um rockstar tem fraquezas é tão engraçado quanto pensar que o presidente dos também tinha.
- Oh, olhe para mim eu sou o cara que vai molhar sua calcinha. – Comecei a imitar de um jeito cômico e exagerado o estilo do Alexander nos cilpes fazendo um sotaque britânico exageradíssimo enquanto o fazia.
- Tá tudo bem, Dani? – A Senhora Martinez me fez tomar um susto, dei um eleve saltinho da cadeira, que era velha e acabou rangendo junto com meu movimento. A mulher deu um sorriso meio bobo e eu senti que ela estava vendo minhas reações há um tempo e se divertindo com ela.
- Tá sim. – A mulher assentiu com a cabeça segurando o riso nos lábios. – Você pode trazer uma xícara de café para mim?
- Claro! – E ela saiu dando risadinhas. Senti meu rosto corar.
***
Marie entrou na John John enquanto me prometia com um sorriso nos lábios:
- Você vai sair igual uma celebridade. – Reviro os olhos. Por Deus, Marie fala muita besteira.
- Eu vou sair pobre. – Ela riu alto e chegou cumprimentando todo mundo na loja. Logo reconheci que o gerente, que eu logo supus por ser um pouco mais velho que os outros naquele lugar, tinha uma tatuagem que havia sido visivelmente desenhada por Marie.
- David, me diz o que você usaria no camarote de um show da banda Arctic Monkeys. – Marie chegou no balcão colocou as palmas das mãos sobre eles e olhou fixamente nos olhos do gerente.
Ele deu um sorriso malicioso, os dois pareciam ser do mesmo planeta estranho.
- Se eu fosse uma mulher e quisesse conquistar o coração do Alexander? – Marie aumentou seu sorriso de gato da Alice no País das Maravilhas. Confesso que pensei que ela fosse desaparecer do nada também.
- Sim. – Resolvi não falar sobre o assunto, era ela se metendo naquela historia e eu não queria entregar meu jogo.
David deu um sorriso malicioso e foi até uma das araras enquanto eu via Marie lançar um olhar afetado, como quem diz “eu sei muito bem o que eu tô fazendo” e cruzava os braços. Segurei uma mão com a outra e olhei enquanto o vendedor trazia um vestido preto acompanhado com um casaco de couro.
- Isso daqui. – A roupa era linda, de verdade, mas a única coisa que eu conseguia pensar era:
- Vocês dividem em quantas vezes?
***
Meus pés estavam doendo.
Depois de voltar da loja Marie me fez andar mais com ela, porque ela também queria comprar roupa nova, e depois me levou no Starbucks onde me pagou um frappuccino. Eu nunca fui muito fã do café de lá, ia mais pelo hype do lugar.
O elevador estava quebrado, pra variar, e fui obrigada a subir cinco andares de escada. O show era no dia seguinte e eu estava morta de cansada.
Respirei fundo e empurrei a pesada porta corta-fogo do meu andar. Respirei fundo, cansada, precisava tomar um copo de água. Pesquei minhas chaves no bolso do meu enorme casaco jeans e fui logo abrindo a porta. Com a outra mão eu peguei o celular no bolso e chequei as horas. 23 horas, eu não costumo a chegar tarde assim.
Enquanto giro a chave e abro a porta do meu apartamento escuto do outro lado a guitarra de Alexander. Respiro fundo, ele está tocando baixinho uma música super lenta. Mordo o lábio inferior.
“Será que devo perguntar a ele se está tudo ok pra amanhã?”, questiono a mim mesma enquanto entro e vou pra cozinha, enchendo um copo com água da geladeira, deixo a porta aberta assim como a minha mente está para questionamentos.
Enquanto viro o copo garganta abaixo começo a imaginar ele sentado na sala da casa dele, vestindo apenas um jeans, sozinho, com vinis de Jimi Hendrix, Janis Joplin e Bob Dylan espalhados pelo chão.
Imaginei sua barba por fazer, ele tinha cara de quem não tinha desenvolvido muita barba e por isso raspava, imaginei seu cabelo sem gel e completamente bagunçado. Imaginei em seu lado direi um cinzeiro cheio de bitucas queimadas e no canto esquerdo de seu lábio um cigarro caído enquanto soltava uma leve fumaça.
Aquela cena quase poética fez com que eu terminasse o copo, colocasse na pia e saísse do meu apartamento, não me esquecendo de encostar a porta para esconder a bagunça e a sacola com as roupas.
Ok, confesso que eu também não queria mostrar a ele que tinha comprado roupas especialmente para o show, não queria ceder ao “molhador-de-calcinhas” a minhas verdadeiras intenções que estavam mais do que conscientes, mas eu insistia em esconder.
Respiro fundo e dou três batidas na porta do apartamento 505.
A guitarra para, silêncio, escuto a guitarra sendo colocada no chão, barulhos intensos de passos.
- Quem é? – Ele grita do outro lado.
Bolo na minha garganta.
“Acho que fiz merda”, penso.
- É a Daniela! – Respondo. Mais passos, um xingamento do outro lado. Barulhos de alguém girando a chave e soltando trinco da porta. Alexander aparece bem na minha frente. Ele está exatamente do jeito que eu imaginava, mas não consigo deixar de notar que há algo estranho nele.
Seu corpo está rígido, vejo claramente deus músculos tensionados.
- Aconteceu alguma coisa? – Sua voz está trêmula, há algo de muito errado naquela situação.
- Eu só queria saber se tá tudo confirmado para amanhã. – Meus olhos inspecionam o apartamento. Vejo Alex ficar mais tenso e começar a me observar, quase posso notar uma gotinha de suor se formar em seu rosto.
- E-e-está sim. Seu  nome já está na lista. – Ele diz, é aqui vejo um sutiã de renda vermelho no sofá, depois noto uma marca vermelha no pescoço dele. Encaro com tanta força que ele percebe e coloca a mão em cima, fingindo coçar a área, mas já é tarde demais, eu já vi.
A vontade que eu tenho é de brigar com ele, mas não faço isso, ele nota que eu fico desconcertada. Sinto meu olho começar a lacrimejar, mas não tenho nenhuma coragem de reagir.
Me sinto traída pelo amor que nunca conseguiu sequer começar. Respiro fundo, não posso demonstrar minhas emoções na frente dele.

- Obrigada. – Digo seca e dou as costas.

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