She's thunderstorms: Capítulo 10- Festa

    Confraternizações de trabalho são uma coisa curiosa, se pararmos para analisar. Cheguei a essa conclusão depois de tomar meu segundo coquetel de kiwi, que estava bem forte, devo ressaltar. E era algo bem simples de se constatar, na verdade; isso porque todos os convidados chegavam em suas mais elegante roupas, com uma postura impecável, lançando sorrisos a todos com quem cruzassem o olhar; e uma ou duas horas depois, após alguns diretores da empresa darem seus discursos de agradecimento por mais um ano muito produtivo, todos começavam a beber e a dançar por todo o espaço do salão. Era sempre assim.
    Por isso, quando todos se calaram, eu já sabia que era o momento em que algum senhorzinho se dirigiria ao palco, pegaria o microfone, e daria parabéns a todos os seus queridos subordinados. Sendo sincera, eu nunca havia visto aquele homem na minha vida, mas era óbvio que ele era alguém importante na corporação, porque ao seu lado estava o diretor geral da redação da revista, e esse sim eu conhecia.
    Quis pular esta parte da cerimônia. A meu ver, era entediante demais. Podiam falar as mesmas palavras do ano anterior, ninguém perceberia. Estava decidido: eu iria manter distância dos chefões e suas palavras de poder.
    Dei meia volta e fui até o fundo do salão, lá havia uma área mais reservada e casual; o local tinha seu próprio bar, vários sofás de muito bom gosto nas cores bege e vermelho, e a iluminação era mais fraca, causando aquela conhecida sensação de privacidade. Resumindo, era uma área perfeita para casais. Eu era só uma, e mesmo que Patrick estivesse ali, seríamos apenas uma dupla.
    Assim que a imagem de Patrick atravessou minha mente, lembrei que o havia deixado na mesa enquanto ia pegar meu segundo drink. Estiquei-me na ponta dos pés o máximo que pude, procurando por uma cabeleira loira no meio de tanta gente. Quando o encontrei, ele estava de costas pra mim, concentrado nas palavras que saíam ainda do mesmo senhor no centro do palco. Decidi que precisava dele para sanar algumas das minhas necessidades... Mas não agora. Agora eu precisava de álcool, e dada a minha localização, seria algo bem fácil de conseguir.
    Andei até o bar, e lancei meu melhor sorriso para o barman, que me retribuiu com uma piscadela e perguntou o que eu gostaria de beber naquela noite. Ah, eu amava os barmans! Eles eram tão seguros de si, sempre jogando charme para todas as garotas que chegavam procurando alívio ou ânimo em uma bebida. Eles eram apenas sorrisos gentis que possuíam ouro por uma noite. Respondi que queria uma caipirinha bem forte, e foi o que ganhei.
    Escolhi um sofá bege e me recostei, ele era tão macio! Uma vez confortável, fiquei longos minutos revezando entre dar um breve olhar ao entediante palco, me levantar e buscar mais uma bebida. Então finalmente o meu tédio teve fim. A música eletrônica havia começado, e Patrick vinha em minha direção.
    A essa altura eu sinceramente já estava mais alterada do que deveria, levando em conta que todo mundo com quem eu trabalhava estava ali. Mas quem se importava de verdade? Eu não. Lancei um sorriso malicioso assim que Patrick sentou ao meu lado, um gesto que ele retribuiu rapidamente.
─ Será que a gente pode ir lá pra fora? ─ Perguntei depois de ter me aproximado de seu ouvido.
─ Lá fora provavelmente está frio, enquanto aqui parece ser o ambiente perfeito pra... Qualquer coisa. ─ Ele respondeu, e eu só pude levantar as sobrancelhas, como um gesto de quem não esperava que ele dissesse isso, considerando que ele era o cara “eu-sou-profissional” e ali qualquer um poderia nos ver; além de que por mais que suas intenções fossem claras, as razões que o motivavam nunca eram, o que me fez ficar ainda mais desconfiada. Mas é claro, eu não iria deixar isso estragar qualquer chance de começar minhas férias em bom estilo, se é que eu fui clara.
─ Por mim tudo bem. Aqui é ótimo.
     E o beijei. Foi um beijo lento, ainda explorando um ao outro. Coloquei seu lábio superior entre os meus e antes que eu pudesse me afastar, ele mordeu meu lábio inferior, me fazendo sorrir e logo em seguida começar um beijo caloroso. Uma das minhas mãos estava na sua nuca, a outra estava ao lado do meu corpo, segurando um copo vazio. Ele tocava meu rosto com uma das mãos, e a outra estava pousada em minha cintura. As músicas ficavam mais agitadas, e nosso beijo também. Cada toque que eu recebia ia me deixando mais agitada, mas elétrica. Eu precisava daquilo, precisava me sentir cheia de energia, me sentir plena, viva. Eu precisava aproveitar, precisava conseguir o máximo que eu pudesse de todas as boas sensações que aquela noite e aquele homem podiam me oferecer. E foi esse “máximo” que ocupou minha mente pelas horas seguintes.
─ Vamos beber alguma coisa? ─ Eu perguntei me afastando dele pela primeira vez depois que começamos a nos beijar.
─ Não quero ter que sair carregando alguém dessa festa, hein? ─ Ele disse com o sorriso que eu já conhecia.
    Era engraçado tudo isso, já que nos dias de trabalho ele parecia sempre sério e severo; e agora... Bom, parecia outra pessoa.
­─ Eu sei me cuidar. ─ Dei um meio sorriso e me levantei, me dirigindo ao bar principal, longe da área reservada. Percebi que Patrick veio logo atrás.
    Enquanto caminhava até o bar, percebi que Jasmine estava apoiada no balcão, provavelmente fazendo seu pedido ao barman. Assim que ela pôs os olhos em mim, se atirou em meus braços, agindo bem mais alegremente do que o usual. É claro que o nível de álcool no sangue dela era tão alto quanto no meu. Agora estávamos na fase da confraternização em que todos dançavam e bebiam pelo salão. E era exatamente o que eu estava prestes a fazer.
─ Jas, você está maravilhosa! ─ Disse enquanto admirava seu vestido e seu cabelo bem arrumado.
─ Obrigada! Você está muito... Muito linda! ─ Ela comentou pausadamente enquanto passava a mão pelo meu rosto e olhava meu vestido por inteiro. Às vezes era incrível como Jasmine ficava bêbada tão rápido, considerando que ela não é fraca com bebida. ─ E Patrick! Oi... Patrick! ─ Jas acenava e sorria empolgadamente para o homem ao meu lado. Parecia uma criança alegre depois de ganhar um brinquedo.
─ Boa noite, Jasmine. ─ Patrick respondeu um pouco sério, apenas acenando com uma das mãos.
─ Bea, eu só vou pegar isso aqui ─ E apontou um copo cheio de um líquido amarelo-esverdeado (que eu não tinha ideia do que fosse) bem no meu rosto ─ E daqui a pouco vou pra casa do Caio. Divirta-se! ─ E não esperou uma resposta, apenas deu as costas e foi andando rapidamente pelo meio da multidão agitada.
─ Parece que você não é a única exagerando por aqui ─ Patrick comentou ao pé do meu ouvido.
─ É claro que não sou a única. E mesmo assim, quem se importa? Todos vão estar bêbados no final, de qualquer jeito. Eu só estou me antecipando.
    Depois de tomarmos dois drinks cada um, corremos para a pista de dança, agitados demais para perder mais um segundo parados ou conversando. Precisávamos de movimento. Eu sentia isso, vindo de mim e dele. As luzes do ambiente piscavam e junto ao efeito da bebida, era como se fossem apenas flashes na minha frente, era uma sensação de satisfação maravilhosa. Havia suor, havia corpos, havia animação, havia felicidade, havia tudo o que me faltava.
    Ser feliz sem um grande motivo é algo muito fora do comum pra mim. Parece que a qualquer momento essa alegria vai fugir do meu corpo, como a vida deixando alguém depois que a mesma leva um tiro. É exatamente assim que me sinto. Possuindo algo tão bom e precioso, mas que pode ser arrancado de mim bruscamente, sem aviso. Não me entenda mal, não estou reclamando. Me sentir bem sem algo de enorme importância ter acontecido é melhor do que parece ser. Melhor do que posso descrever. Queria e espero ficar assim por um longo tempo, sempre sorrindo e me sentindo bem. Não quero o sentimento vazio que sei que irá se apossar de mim assim que eu voltar a ser... Eu. A Eu estressada, irritada, fria, vazia. Não é de se estranhar que alguém com tantos sentimentos ruins fixos esteja sendo foco de olhares curiosos, como estou sendo agora. Apenas por estar sendo como sempre deveria ter sido: feliz.
    Os minutos se passavam e os convidados de mais idade iam se retirando, provavelmente por estarem muito cansados ou coisa parecida. Mas a festa continuava lotada, frenética. As vibrações de juventude por todo o ambiente.
    Mais uma música eletrônica começava. Dessa vez uma mais sensual e antiga, eu já havia escutado em algum lugar. Patrick dançava na minha frente, e eu me mexia conforme o ritmo provocante. Sabia que a atenção dele esta noite era toda para mim. Aproveitando essa conclusão, virei-me de costas e encostei-me a seu peito, não havendo mais nenhuma distância entre nós. Ele colocou as mãos na minha cintura e começamos a dançar juntos em um só ritmo, e tudo o que importava naquele momento era provocar um ao outro com toques, movimentos e gestos; todo mundo ao redor era dispensável. Era como se houvesse uma bolha e pudéssemos sentir a respiração, o suor, e todas as outras expressões corporais um do outro. Qualquer um que observasse a cena diria que isso era impossível, devido ao volume alto da música, devido à luz oscilante e a todo o caos que nos cercava. Mas de alguma forma, para nós, sentir um ao outro naquele instante era... Fácil. Eram tantas sensações que eu tinha quase a certeza que por meio desses gestos nós mandávamos um ao outro informações sobre nossos corpos. Nós tínhamos total certeza do que o outro sentia. Estávamos conectados fisicamente.
    Eu sabia que ele obtinha as mesmas conclusões que eu, pois tínhamos uma sincronia em cada movimento. Por isso não me surpreendi quando me virei para beijá-lo. Ele já esperava tal ato.
    Tinha gosto de álcool e algo que lembrava suor. De algum jeito, conseguiu ser uma combinação boa. Longe de ser uma das minhas preferências, mas tinha tudo para se tornar. Não houve o tempo de primeiro tocar os lábios, se acostumando com a ação; logo de cara já houve línguas se chocando e reivindicando seu espaço. Eu ganharia. Eu precisava ganhar, e a batalha se estendeu para além de nossas bocas. Eu passava as mãos desesperadamente por seu peito, já havia afrouxado a gravata e aberto os dois primeiros botões de sua camisa. As mãos dele se revezavam entre bagunçar meu cabelo e apertar minha cintura com força, se controlando para não descer mais do que o indicado já que estávamos... No meio de uma pista de dança.
    Nesse momento foi como se uma pequena luz houvesse atravessado minha mente. Uma luz vermelha que dizia repetidamente “Pare!”. Então eu parei e afastei Patrick bruscamente de mim. Essa foi a única vez em que ele não havia previsto um movimento meu.
─ Vamos para o seu carro. ─ Disse para ele encarando seus olhos bem de perto. Levou dois segundos para ele entender tudo, e uma resposta não foi necessária.
                                                ****
    Ainda era escuro quando íamos até o meu apartamento. Patrick dirigia enquanto eu fumava um cigarro do maço que havia comprado logo depois de sairmos da festa. Eu me sentia péssima. Havia algo estranho no ar, o meu estômago embrulhava por um sentimento de culpa que eu não conseguia entender de onde surgira. Ele estava tenso, e até mesmo no sentimento de agonia a nossa sincronia continuava.
    Quando ele parou o carro em frente ao meu prédio, joguei fora o que, se não estou enganada, era o meu terceiro cigarro. Olhei para ele, mas Patrick estava focado no volante do carro, como se fosse algo muito importante naquele momento. As únicas palavras que disse antes de sair do carro foram “boa noite”, e dessa vez ele também não respondeu.
    Quando cheguei até a portaria, o vigilante me deu bom dia. Olhei para o relógio que havia na cabine em que ele ficava e os ponteiros marcavam 4:5oh. Respondi com outro bom dia, dando o melhor sorriso que a minha situação permitia.
    Entrei no elevador e encarei meu reflexo. Meu cabelo estava uma confusão de fios emaranhados de todas as formas; meu vestido havia sido manchado na barriga por alguma bebida; minha maquiagem estava borrada, e não havia mais batom vermelho algum em meus lábios; eu carregava meus sapatos em uma das mãos e minha bolsa na outra. Logo depois de me analisar por completo, algo a mais veio completar minha aparência: lágrimas. Era assim que eu lidava comigo mesma. Encontrava todos os defeitos possíveis para justificar o sentimento ruim que eu tinha, apenas para parecer mais normal, algo que tinha uma causa; fazia isso para não ter que encarar o fato de às vezes minhas própria me causava o pior.
    Eu me sentia miserável, e ao entrar em meu apartamento, a calmaria de minhas paredes nuas não foi suficiente. Coloquei a carteira de cigarros no decote de meu vestido e joguei meus sapatos e a pequena bolsa no chão, enquanto caminhava até o banheiro. Chegando lá tirei todo o tipo de joia que usava, e retirei o vestido. Repousei o maço de cigarros na bancada abaixo do espelho e me coloquei debaixo do chuveiro, deixando a água gelada me livrar de todas as coisas negativas que insistiam em grudar-se a mim. Peguei uma esponja e esfreguei todo o meu corpo, suavemente, enquanto meu choro cessava. Fechei os olhos e senti a calmaria ao redor, a calmaria que eu esperava se apossar de mim e permanecer em minha alma. Sentei-me no chão. Relembrei o que havia acontecido na noite anterior e não encontrei algum erro que justificasse meu estado. Não fazia sentido. Mas o que eu esperava justificar quando eu mesma não fazia sentido?
    Não queria pensar nas negatividades sobre mim mesma, não queria tornar-me autodestrutiva. Não quando um espetáculo estava prestes a acontecer. Havia aberto meus olhos e os primeiros raios de sol atravessavam o balancim do meu banheiro.
    Levantei-me e desliguei o chuveiro. Vesti uma camisola preta e acendi um cigarro. Subi no balancim e sentei-me, deixando as pernas balançarem no ar.
    Era engraçado como as coisas da própria natureza me faziam mudar, dependendo das minhas próprias intenções. Há alguns dias, ao sair da casa de um dos caras de uma noite só, os raios de sol da manhã significavam o pior, significavam encarar a realidade que me seria imposta, e eu estava pessimista sobre isso. Mas agora eu não tenho responsabilidades a encarar, não tenho compromissos; e a meu ver, não há nenhum jeito de isso soar mal. Além do mais, pelo menos hoje, depois desse banho, eu tinha a intenção de ficar bem. Mesmo depois de um sentimento ruim e inexplicável ter tomado conta de mim, havia esperança de mudar para algo leve e positivo.
    E foi esquecendo o péssimo jeito com que esse dia começou, e esperando que alguma força do destino me reservasse algo bom, que observei o sol se erguendo majestoso por entre os prédios daquela cidade que aos poucos era iluminada.






 N/A: Olá! Eu sei que nunca deixei notas aqui na história mas acho que agora vou precisar hahaha só queria que soubessem que a fic tem twitter e que podem falar comigo por lá, além de terem uma previsão de quando sai o próximo capítulo! O user é @thunderstormfic. E é só.
Beijos, Clarissa.

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